Página virada?

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João Telles Corrêa Filho Telles Corrêa Filho

Consultor Empresarial

João Telles Corrêa Filho*

Dilma Rousseff foi definitivamente apeada da presidência após nove intermináveis meses do processo de impeachment. Muito ainda haverá de ser dito sobre a legitimidade deste procedimento e da posse de Michel Temer como novo Presidente da República: petistas e seus aliados passarão os próximos anos produzindo documentários, organizando eventos e promovendo passeatas em nome do combate ao que chamam de golpe. É natural. Estarão defendendo crenças e posições ao mesmo tempo em que irão preparar mudanças internas que evitem a virtual morte do partido e de seus ícones.

Muitos virão com o bordão de que esta página de nossa história foi virada e que, de agora em diante, cabe-nos lamber as feridas, olhar para frente e iniciar a recuperação do que restou do Brasil após o desastre dos últimos anos. Outros afirmarão que, para que isso seja possível, será necessário esquecer as diferenças e os embates que travaram o país por tanto tempo, promovendo uma convivência mais civilizada entre as correntes políticas antagônicas que ocupam o cenário nacional desde a década de 90.

No entanto, poucos se lembrarão da necessidade de NÃO nos esquecermos de tudo o que foi feito para conduzir a nação ao maior desastre econômico de nossa história. Temos que aprender com os erros do passado para evitar repeti-los no presente e no futuro. Teremos que nos lembrar, a cada nova oportunidade de voto, que populismo e demagogia servem somente para destruir empregos e riquezas, promovendo maciças transferências maciças de renda em direção oposta àquela prometida pelo populista. Teremos que ter viva na memória os tristes resultados da malfadada experiência da estatização dos meios de financiamento e produção, fonte de ineficiência e corrupção que provocou déficits insustentáveis e a falência dos já sofríveis serviços públicos essenciais. Não poderemos jamais nos esquecer que a indústria brasileira foi sucateada e que o Brasil voltou a ser uma economia quase que somente agrária como resultado do populismo cambial, da voracidade tributária e da insanidade burocrática que caracterizaram as ditas políticas sociais e a trágica “nova matriz econômica”. É vital mantermos vivas na memória as consequências do desmanche promovido na estrutura administrativa do Estado a partir do aparelhamento partidário e da promoção de pessoas a cargos importantes somente por serem fiéis aos ditames partidários, práticas típicas das nações atrasadas e autoritárias. É nossa obrigação, como cidadãos, não permitir que caia no esquecimento que quase perdemos os vinte anos de esforços empregados na construção de uma economia sadia ao permitirmos que um grupo de sectários liderados por um espertalhão destruíssem, em nome de uma Constituição que nunca apoiaram, boa parte dos resultados conquistados com muito esforço desde a queda de Fernando Collor.

Página virada significa superação de obstáculos e encerramento de ciclos.  O impeachment virou a página da história mas não apagou seus registros. Os erros que nos levaram à segunda interrupção de um mandato presidencial em apenas 24 anos não podem ser esquecidos e suas lições devem ser usadas para pavimentar o início imediato das reformas pelas quais tanto clamamos. Mais do que o sistema político, nossa Constituição exige uma revisão urgente feita por cidadãos que não detenham cargos políticos, não pertençam a partidos e que dediquem seus conhecimentos e experiências à tarefa de livrar a Carta Magna dos vícios somente aceitáveis no clima de redemocratização presente em 1988. Os temores então presentes não mais se justificam, as premissas econômicas da época não mais existem e as aspirações da sociedade mudaram radicalmente – é imperativo ajustar o regramento jurídico à realidade que se impõe e que se faça isto à luz das lições ora aprendidas.

* João Telles Corrêa Filho é engenheiro e consultor empresarial (www.tellescorrea.com.br).