Feito para não funcionar
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João Telles Corrêa Filho*
Fato 1 – Depois de apenas três anos, uma outra barragem de uma das maiores mineradoras do mundo colapsou. Dezenas de pessoas morreram e muitas outras ainda irão engrossar a macabra estatística, ao mesmo tempo em que perícias, laudos e pareceres técnicos são produzidos para atestar que o sistema é seguro.
H Fato 2 – Passados seis anos do início da Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal não consegue concluir nenhum, ou quase nenhum, processo contra os privilegiados representantes da massa pagadora de impostos absurdos, tudo em meio a uma retórica oca e medieval regada a cafezinhos servidos por lacaios fantasiados com “capinhas”, garantindo que o “devido processo legal” seja observado.
Fato 3 – O estado brasileiro produz, ano após ano, déficits bilionários mas os três poderes se recusam a aprovar uma reconstrução absolutamente indispensável à sobrevivência do país, indicando que caminhamos resolutamente para um cenário muito parecido com o da Grécia de alguns anos atrás. E ai daqueles que se atrevem a dizer que o sistema vem ruindo desde a promulgação da calamitosa Constituição de 1988: são crucificados pelos “progressistas” de uma esquerda que insiste em olhar para 1917, enquanto os cidadãos amargam analfabetismo, esgotos a céu aberto, ondas de violência e pandemias do século XIX. Dezenas de outros eventos podem ser citados. E o que todos eles têm em comum? Mais de cinco séculos de distorções. O Brasil, desde o século XVI, construiu um sistema burocrático insustentável que tem, como único objetivo, perpetuar a classe do funcionalismo – aqui entendidos os políticos, juízes e burocratas – no poder e garantir que nada seja feito para mudar essa situação. Quem leu a excelente “História da riqueza no Brasil” de Jorge Caldeira, observou que, enquanto o cidadão trabalhava e produzia, o poder central – representado pela realeza de Portugal, por nosso ridículo império e por uma república que já nasceu esclerosada – tratou de criar e aperfeiçoar um sistema de leis e normas cujo único resultado foi garantir a própria sobrevivência, impedir que mudanças fundamentais fossem concretizadas e assegurar a impunidade para funcionários corruptos e aqueles que lhes pagam subornos. Assim, foi criado um sistema jurídico que impossibilita que processos sejam concluídos e criminosos (ricos) sejam punidos, garantindo honorários milionários para advogados pagos com dinheiro desviado e perpetuando o círculo da corrupção. Ministros dos tribunais superiores são indicados, aprovados e, eventualmente afastados, pelos mesmos políticos que serão julgados por eles mesmos! Ao mesmo tempo, esses mesmos políticos escrevem leis que garantem privilégios aos juízes e a centenas de milhares de funcionários que formam sua base de apoio eleitoral e dividem salários com os dignos representantes do povo. Quando surgem alguns poucos funcionários que discordam dessa lógica e tentam romper o círculo da impunidade, o sistema trata de expurga-los, assim como nossos anticorpos matam bactérias invasoras. Além do aspecto revoltante da corrupção, a face econômica deste modelo faz que o Brasil não progrida, passe por crises cíclicas e se aproxime cada vez mais do grupo de nações subdesenvolvidas da África e da América Latina. Este sistema de compra e venda de favores é extremamente caro e a saída se dá sempre pela dupla dívida-inflação, senão vejamos: caso o novo governo não consiga fazer reformas estruturais dignas deste nome, em poucos anos não haverá dinheiro para pagar aposentadorias e pensões (como já acontece em alguns estados e municípios). Quando isso acontecer, os políticos terão uma escolha pela frente: reduzir drasticamente os valores pagos a funcionários públicos e ao resto dos mortais ou desrespeitar as leis e imprimir moeda. Alguém tem dúvidas sobre qual será e escolha? Obviamente a Casa da Moeda será chamada a fazer horas extras e a inflação “corrigirá” o problema. Isso sempre foi feito no Brasil – governos imprimindo dinheiro para cobrir os buracos de bancos e empresas públicas, financiar obras e até mesmo pagar despesas correntes, até que veio a Lei de Responsabilidade Fiscal, que acaba de ser “relaxada” para os municípios. O resultado será o de sempre. Inflação e recessão. Ou … podemos finalmente aprender a ter juízo. Qual sua aposta? * João Telles Corrêa Filho é engenheiro e consultor empresarial (www.tellescorrea.com.br).