Porquê a PEC 241 é necessária …
João Telles Corrêa Filho*

… Mas não suficiente.As discussões sobre a PEC 241 que estabelece um teto para o total das despesas públicas federais vêm sendo feitas em um ambiente contaminado pela polarização política que domina o Brasil, desde que Dilma Rousseff deu à sua campanha eleitoral tons de uma dança de guerra tribal. Este estado de espírito não contribui em nada para que a proposta seja compreendida, discutida e, eventualmente, aprimorada. Por este motivo alguns dos principais pontos devem ser analisados com a serenidade necessária em assunto de tamanha importância.
O ajuste fiscal é vital e independente de visões ideológicas. A maior prova disso é que já havia sido proposto pela própria Dilma Rousseff que, para efetiva-lo, nomeou um profissional com carreira em um dos maiores bancos privados brasileiros e com passagens anteriores pelo setor público, quando foi responsável por colocar as contas públicas em ordem no início do governo Lula. O que este ajuste anterior fez foi aumentar impostos e cortar gastos, o que é de uma obviedade meridiana e incompreensível somente para aqueles que não dominam as complexas operações de soma e subtração. Como um novo aumento de impostos é intolerável pela sociedade e ineficaz para a economia, a PEC 241 limitou-se ao ponto da contenção das despesas (contenção e não redução), estabelecendo um freio à continuidade do crescimento observado desde a promulgação da Constituição. Fica demonstrado que tentar dar um viés ideológico a esta medida é atitude intelectualmente desonesta e medíocre, a serviço apenas de quem desgosta da estabilidade.
A PEC propõe cortes em educação, saúde e habitação. Esta falsa afirmação vem sendo exaustivamente repetida por políticos de oposição inconformados com o afastamento do governo anterior e representa o mais puro terrorismo contra as pessoas mais simples e vulneráveis a tais argumentos. A PEC 241 estabelece somente que as despesas TOTAIS do governo federal não poderão crescer além da inflação do ano anterior. Ora, isso significa que, se as despesas com saúde podem crescer além do IPCA, desde que outras cresçam abaixo deste índice. Nada além disso. Neste ponto a medida terá um efeito colateral extremamente educativo e benéfico à democracia, pois obrigará que, finalmente, o Congresso Nacional discuta o orçamento com seriedade, estabelecendo prioridades, eliminando desperdícios e olhando para o futuro. Ademais, vale lembrar que as despesas com educação e saúde concentram-se em sua maior parte nos estados e municípios que, por enquanto, ainda não tomaram providências de teor parecido.
A dívida pública poderá voltar a níveis mais confortáveis. Dado o prazo de 20 anos previsto pela PEC e supondo que o Brasil volte a crescer a uma taxa média de 3% ao ano e com a inflação dentro da meta, haverá uma sucessão de superávits primários que permitirá, além do pagamento dos juros da dívida, uma amortização do principal ao longo do tempo. Com isso três efeitos benéficos surgirão naturalmente: os juros poderão cair gradativamente até os patamares praticados por economias emergentes mais equilibradas (algo como 3% reais ao ano), nossa classificação nos ratings internacionais voltará a melhorar (favorecendo investimentos nacionais e estrangeiros de longo prazo) e, como consequência dos anteriores, a economia e a renda voltarão a crescer gradativamente.
O prazo de 20 anos estabelecido pela PEC é adequado e flexível. Este ponto também tem provocado muita polêmica mas, pensando com serenidade, veremos que 20 anos representam menos do que uma geração, o que não é nem um pouco exagerado em termos de nação. Empresas fazem planejamento estratégico com prazos semelhantes, subdivididos em períodos menores. Estranho é um país que faz seus planos olhando somente até a próxima eleição. Também há que se notar que a PEC prevê uma reavaliação após dez anos o que, convenhamos, é um prazo até reduzido.
Esta proposta de emenda à Constituição é suficiente para fazer do Brasil um país economicamente mais sadio? A resposta óbvia é um retumbante NÃO. A PEC 241 é apenas um procedimento de emergência visando estancar a hemorragia e impedir o colapso final da economia. De nada adiantará se não implantarmos, com urgência, pelo menos:
A tão reconhecidamente necessária reforma da previdência. As despesas com pensões e aposentadorias são, de longe, o maior esforço financeiro feito pela união, estados e municípios. O teto previsto na PEC será rapidamente desrespeitado se não houver uma contenção importante dos gastos previdenciários, o que só será aceito pela sociedade com o fim dos inacreditáveis privilégios dos funcionários públicos, políticos, militares e membros do Judiciário e Ministério Público. Essas benesses, além de imorais e revoltantes, são desastrosas do ponto de vista fiscal e, caso mantidas, inviabilizarão qualquer ajuste duradouro.
O “desengessamento” do orçamento com o fim da vinculação de despesas às receitas. Nada pode fazer menos sentido do que destinar obrigatoriamente um percentual fixo da receita a uma determinada despesa. Isso demonstra preguiça em se pensar, pelo menos uma vez ao ano, a respeito dos objetivos, necessidades e realidades do país. Colocar o orçamento “no automático” não traz nenhum benefício aos cidadãos.
A também já exaustivamente debatida reforma tributária, sem a qual seguiremos desperdiçando tempo e oportunidades de tornar as atividades produtivas mais eficientes e competitivas. Sem esta reforma seguiremos como um país atrasado, burocrático e injusto, com impostos regressivos e com um modelo extremamente vulnerável à sonegação e à corrupção
Um programa abrangente de privatizações que venha a dar à população a oportunidade de contar com um estado menos obeso e com serviços de qualidade minimamente aceitáveis.
Se o governo de Michel Temer conseguir ao menos desarmar espíritos e começar a operação de salvamento com a aprovação da PEC 241 já terá garantido um lugar na história.
* João Telles Corrêa Filho é engenheiro e consultor empresarial (www.tellescorrea.com.br).